SDA reúne organizações e discute inserção de sementes crioulas no Hora de Plantar

25 de setembro de 2024 - 16:36

Texto: Marcel Bezerra Fotos: Nildo Vasconcelos

Com o objetivo de construir ações e políticas públicas que promovam o fortalecimento e a preservação das sementes crioulas, a Secretaria do Desenvolvimento Agrário do Ceará realizou nesta quarta (25), a oficina “Sementes da Vida”. A abertura ocorreu pela manhã, no auditório da secretaria, com a participação do secretário da SDA em exercício, Marcos Jacinto, da secretária executiva Irineuda Lopes, de representantes da Ematerce, de movimentos sociais e casas de sementes de diversas regiões do estado.

De acordo com Irineuda Lopes, que coordenou a oficina junto com a Coordenadoria de Desenvolvimento da Agricultura Familiar (Codaf), a ideia é construir uma política pública para a compra de sementes a partir das organizações no Hora de Plantar. “Nesse objetivo, estamos aqui para dialogar, Estado e sociedade civil, a fim de criar uma política específica dentro do programa para a compra de sementes crioulas e para a estruturação desses espaços que são das organizações camponesas que estão nos territórios”, detalhou.

O secretário Marcos Jacinto considera as sementes crioulas como “um elemento fundamental de preservação do nosso patrimônio genético, de fazer a relação da semente com produção de alimento saudável, com resiliência climática, porque no semiárido precisamos cada vez mais fortalecer essa pauta”. Na opinião dele,  a semente não é só aquilo que a gente enxerga do ponto de vista material. “Há uma simbologia muito forte. E isso é que faz essa trajetória ser tão brilhante, que começou com os agricultores e as agricultoras, e que aos poucos a gente vem juntando instituições, lideranças, organizações que também entendem”, acrescentou. 

Jacinto afirmou que o momento é de materializar a luta histórica dos agricultores em políticas públicas. Nesse sentido, citou o projeto do deputado e secretário Moisés Braz, aprovado na Assembleia, que criou a política estadual de incentivo à formação de casas e bancos comunitários de sementes crioulas e mudas – Lei nº. 17.179/2020. Marcos anunciou ainda que a próxima edição do Programa Hora de Plantar, cujo investimento deve saltar de R$ 27 milhões para R$ 34 milhões, já prevê a aquisição de sementes crioulas. Para isso, ressalta, ainda é necessária a regulamentação da lei. “Precisamos ir Seplag para conversar com o secretário Alexandre Cialdini e tocar isso”.

A oficina teve como motivação o mapeamento dos bancos e casas de sementes recentemente publicado pela SDA, e também tem o fito de definir de forma conjunta a estrutura de apoio a uma ação piloto relativa às sementes crioulas, além de construir e definir parâmetros necessários à estruturação do Programa Estadual de Sementes Crioulas. 

Organização de entidades fortaleceu sementes crioulas

 

Coordenador no Esplar, Nacélio Chaves representou o Fórum Cearense pela Vida no Semiárido (FCVS) e destacou a capacidade organizativa das casas de sementes. “Depois de um período de pandemia, em que as entidades passaram por um afastamento, entre outras questões, termos registrado 255 casas ativas, com as famílias se reunindo, conversando sobre as sementes crioulas, se mobilizando, demonstra a força que é a casa de semente e a importância dela para as comunidades”, discorreu. A perspectiva de comercialização para o Hora de Plantar é vista como um grande passo. “As famílias vão estar comercializando suas sementes e a semente crioula vai estar sendo distribuída a outras famílias para que essa semente possa ser multiplicada, é um avanço imenso. Essa é a nossa luta, nossa pauta, e a gente está muito feliz de estar aqui”, acrescentou.

José Francisco ressaltou o papel da Fetraece de valorizar as sementes crioulas, com o trabalho de articulação de experiências piloto. Ele defendeu mais investimentos em sementes crioulas. “Desses R$ 27 milhões que hoje são comercializados, que pelo menos uma parte desse dinheiro também venha para as nossas casas de sementes”, pontuou. “Temos de induzir a formação de mais casas, para termos um grande banco genético e podermos comercializar para o Hora de Plantar”, acrescentou.

Para Fernanda Aquino, debate sobre as casas de sementes crioulas é oportuna diante do atual cenário de catástrofes climáticas, incêndios que devastam florestas, principalmente aqui no Brasil. “É muito importante a gente firmar essas parcerias no sentido da construção de um planeta mais justo, e as casas de cimentes estão nessa perspectiva. A gente sabe que existe um pomar oculto no coração de cada semente. E essa semente precisa ser cuidada, o solo precisa ser cuidado, manejado. Todo o cuidado que a natureza exige, que nós esquecemos. Estamos numa fase de destruição e não de construção. E a secretaria, muito sabiamente, nesse momento, tem a perspectiva e dessa política pública”, explicou. 

Para Fernanda, o trabalho de levantamento das casas de sementes no Ceará é a base de tudo. “E a Ematerce, como vinculada, que faz toda a operacionalização do programa Hora de Plantar a nível de município, a nível local, junto ao agricultor familiar, está junto no fortalecimento da agroecologia, em busca dessa matriz tecnológica, de práticas agroecológicas sustentáveis. E isso começa pela semente. Então é fundamental, nesse momento, a gente dar as mãos”, conclamou. Na opinião dela, semente é um espaço de cultura alimentar, de práticas políticas e sociais, de buscar segurança alimentar das pessoas e de alimentos saudáveis.

“Em nome dos agricultores, digo que estou muito feliz. Falar de uma coisa que a gente há vinte anos briga, tema, bate, discute, e nunca teve êxito, é muito importante. Durante todo esse tempo, tivemos uma parceria grande das ONGs, muitas vezes contra os governos municipais que não queriam. É preciso que o Estado veja o lado do agricultor. Se isso decola, o agricultor também vai decolar. Que essa iniciativa dê certo, e eu vou estar junto”, comemorou o agricultor João Félix, guardião de sementes Sítio Riacho do Meio, em Choró

Representante da Rede de Intercâmbio de Sementes (RIS), Paulo César classificou o momento como de culminância do processo de fortalecimento das casas de sementes. “A fala do agricultor chegou até o governo. Se foi mapeado esse tanto de casas de sementes, significa que uma turma grande que esteve trabalhando e mantendo tudo isso”, constatou, ao colocar que a rede celebra isso de forma especial através das festas da colheita. “Celebra com o agricultor o momento da colheita dos frutos do trabalho, a organização, a cultura e a espiritualidade das pessoas”, disse. Na visão dele, os agricultores antes se sentiam sós nesse processo, “e agora estamos caminhando de pés e mãos dadas. Foi importante termos avançado em legislação, precisamos evoluir, mas temos uma base com potencial produtivo. Tenho certeza que esse processo vai ser um sucesso”, assegurou.

Em nome do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Antônio José, o momento é de comemorar. “Não é para a gente parar aqui, mas também saber que muitos avanços já temos”, observou. Ele acredita que “a cooperação precisa ser fortalecida para a gente colocar as sementes crioula no patamar que a gente quer”.